terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Kasparov x Deep Blue


Alguns dias atrás estreou em Nova Iorque um documentário que revive um episódio decisivo na história do xadrez e da inteligência artificial. O desafio gerou algumas controvérsias em 1997, ano em que ocorreu o episódio, e que ainda hoje não foram encerradas. Game Over: Kasparov and the Machine (Fim de jogo: Kasparov e a máquina) indaga os sucessos e as hipóteses que cercaram a derrota do campeão mundial frente a Deep Blue, o supercomputador da IBM. Para muitos foi um duelo entre duas máquinas, no entanto o recente filme de Vikram Jayanti tenta postular – com os recursos paranóico-conspirativos oriundos dos filmes de suspense – que havia obscuros interesses em jogo, e que a derrota de Kasparov, metade judeu metade armênio, teve uma enorme significação política.

Em meados da década de 1990, a IBM estava perdendo parte de sua clientela para a muito mais jovem Microsoft e outros novos adversários. Necessitava, então, de um certo golpe publicitário para provar a sua agilidade e dinamismo no mercado dos bits e chips. Já em duas ocasiões (1989 e 1996) Kasparov havia vencido com certa folga e agilidade as duas versões anteriores da máquina. Programada para 1997, a revanche – como ainda hoje Kasparov concorda – “era uma grande idéia”. O mesmo Kasparov precisava melhorar a sua imagem pública: já havia passado mais de uma década desde que arrebatou o título mundial de Anatoly Karpov, o mestre russo protegido pelo Politburó.

Após um primeiro encontro triunfal com Deep Blue, Kasparov enfrentou no ano de 1997 uma série de derrotas que foram ajudadas em parte pela ansiedade, as múltiplas pressões e a enorme exposição pública a que havia se submetido. No entanto sua mãe o aconselhava a “comportar-se como um homem” e enfrentar as câmeras também no fracasso, a mídia falava de um monstro tecnológico capaz de humilhar o ser humano para sempre e a revista Newsweek colocava como título da capa: A última oportunidade do cérebro humano, Kasparov e seus defensores alegavam que havia algo mais. Segundo o grande mestre: havia algo “demasiado humano” nas novas decisões – menos mecânicas – da máquina. Insinuou uma suspeita sobre a existência de uma possível seleção de grandes mestres operando nas sombras, e esta suspeita ficava agravada pelas condições nas quais havia se desenvolvido o jogo (incluindo o ar condicionado), tudo parecia estar preparado para a “convivência da máquina com dezenas de pessoas a seu serviço”, e Kasparov disse que a IBM havia lhe prometido cópias impressas dos processamentos de seu adversário, mas que nunca entregou.

Nesta ocasião a IBM ganhou por volta de 500 milhões de dólares em publicidade e estabeleceu um recorde na cotação de suas ações. “Creio que a IBM nos deve, a mim e ao resto da humanidade, uma revanche”, escreveu algum tempo depois Kasparov, desafiando a companhia para uma série de dez jogos em vinte dias: “É tudo ou nada, e isto não é por dinheiro. Todos estão esperando uma resposta.”

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